Rua de S. Miguel (1914)

Rua de S. Miguel
(Alfama)
 
Aguarela sobre papel
64 x 40 cm
1914
Feito para a obra Lisboa Velha, estampa 89
(Comprado pela Câmara Municipal de Lisboa)
Ver ♦ Exposição de 1918
Estampas 08, 18, 43, 54 e 89
     Quando falamos da importância do espaço urbano, no espólio da obra do pintor Roque Gameiro, referimo-nos a Lisboa. Foi esta a cidade que ele percorreu minuciosamente, retratando os seus espaços e as gentes que por eles passaram.
   Esta imagem de uma das ruas mais típicas de Alfama constitui um expressivo documento humano. A topografia desse local pouco mudou; alguns dos tipos humanos desapareceram, mas outros permanecem. Em relação a estes, só o vestuário sofreu alterações, pois muito do seu comportamento se mantém.
   As edificações revelam uma acentuada verticalidade, que a pouca largura da rua ainda mais acentua. A intensa luminosidade que, vinda de frente, inunda quase tudo, contrasta com alguns espaços mais sombrios, onde o sol ainda não chegou. A alta torre da igreja eleva-se em plena luz, para o céu de um azul diáfano. Quase todos os prédios à sua volta usufruem, igualmente, dessa intensa claridade, diluindo-se alguns dos pormenores da sua arquitectura. O primeiro plano, envolto numa meia sombra, permite uma melhor visualização dos detalhes das velhas habitações e da roupa estendida a secar. Enfatiza-se a imagem do cobertor de riscas de cores vivas, que, sinestesicamente, permite adivinhar uma textura macia, mas pesada.
   Os habitantes ou aqueles que se limitam a passar parecem estar todos dominados por uma plácida ociosidade, exceptuando-se a mulher que se ocupa a estender roupa: quase todas as personagens são captadas em posições praticamente estáticas. O pintor não pretendeu, porém, transmitir-nos uma imagem de vida estagnada. A vida não parou, é o ritmo de vida que é lento e que se manifesta por estas atitudes de tranquilidade perante o dia-a-dia, que se repete indefinidamente, sem pressas.
Maria Lucília Abreu
in Roque Gameiro - O Homen e a Obra, ACD Editores, 2005
Ver:
1915-12-21 - O Mundo
1918-02-14 - A Capital - A Exposição dos Consagrados, por Parocínio Ribeiro
 
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